terça-feira, 22 de novembro de 2011

Mas Obrigado Por Oferecer

Uma pessoa anda na rua, sozinha, no horário de pico, chega na frente da estação de metrô e decide pegar um ônibus mesmo, a fila está enorme.
Esta pessoa continua andando até chegar no ponto. Ela carrega uma daquelas embalagens de isopor com um bolo de cenoura dentro, uma colher e om garfo de plástico nas mãos. A embalagem está bem segura, as duas mãos firmes seguram aquele bolo como se fosse alguma coisa que fosse mudar o mundo.
O ponto de ônibus finalmente chega. Ele (é um rapaz) pergunta a uma mocinha de o seu ônibus já passou e ela diz:
– Eu acabei de chegar!
Ele olha para os lados e permanece em pé. Vê numa placa atrás do ponto o numero do seu ônibus e se vira para ver os que vêm em direção ao ponto, nenhum deles é o seu, mas é o de um homem que está sentado. Embora tivesse um lugar vazio, ele prefere sentar-se no lugar do homem que acaba de sair.
Alguns minutos se passam e o ônibus finalmente chega. Ele entra, paga, senta ao lado de um homem, coloca a bolsa no colo, a embalagem em cima da bolsa, se ajeita, abre-a e começa a comer o bolo.
– Não vai oferecer?
O garoto assustado responde:
– Não, oras! Por que deveria?
– Você sabe se eu quero?
– Não, e nem te conheço.
– Esse pode ser meu bolo favorito, sabia?
– Pois então compre um!
– Você deveria oferecer um pedaço do seu bolo para as pessoas.
– Não deveria não! Imagina! Se eu oferecesse um pedaço do meu bolo pra cada um nesse ônibus, eu ficaria sem.
– Claro que não! As pessoas podem recusar.
– Eu prefiro não correr o risco.
O rapaz volta a comer seu bolo.
– Você não vai oferecer mesmo?
–Você quer? – responde irritado.
– Não, obrigado! – e sorri.
– Você me inferniza da vida por causa de um pedaço do MEU bolo, que EU comprei e fiquei perambulando por esse centro com ele com o maior cuidado para não perder nem um pouquinho da cobertura pra dizer que não quer um pedaço?!
– É! – diz o homem com a maior tranquilidade.
O garoto fica com uma expressão que é um misto de indignação e perplexidade na face por alguns segundos mas volta a comer.
– Mas obrigado por oferecer.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Sinto

          Sinto um clima de sedução sem compromisso no ar. Às vezes não é nada disso, é só uma impressão, uma miragem que eu crio pra não me sentir frio. Mas não deixo transparecer (eu acho), é uma coisa que eu faço pra mim mesmo, pra satisfazer alguma necessidade sentimental, é uma relação minha comigo mesmo e com a participação de um terceiro que não sabe que participa, ou sabe e finge não saber. Me fiz claro?
          De qualquer forma, não é a primeira vez que isso acontece. Eu vivo em constante processo de me apegar às pessoas por qualquer motivo. Eu creio que seja uma certa carência, não sei, que desencadeia isso. Pensando bem, é uma carência, e é essa carência que me faz ver coisas onde não tem, ou até tem.
          Mas isso não muda o meu pensamento do momento. Não quero namorar ninguém, não quero seriedade, formalidade, o informal é tão divertido. Pode ser que eu mude de ideia amanha ou depois, mas mesmo assim, não quero um relacionamento monótono, certinho, quero ter meu espaço, meu tempo comigo mesmo, nada muito pegajoso, não o tempo todo. Quero espaço pra estar no mesmo lugar que a pessoa e não necessariamente estar junto, eu tenho amigos também. Acho que é isso, não quero viver em função de ninguém e não quero que o oposto aconteça.
          Pensando agora, também acredito que seja um cero medo, não sei de que, do desconhecido talvez, ou de outro trauma. Traumas são importantes para nossas vidas. Não necessariamente traumas, mas choques, mas não faço questão de me "traumatizar" agora.
               Enfim, é isso.

Crônica Sobre Ontem (escrito em 15 de Julho de 2011)

          Um lugar desconhecido, cheio de pessoas desconhecidas, todos ali pelo mesmo motivo e, a maioria, não querendo estar lá. De repente, enquanto se olha em volta, um rosto conhecido aparece e tudo o que você quer é ir falar com essa pessoa para tirar um pouco da tensão do momento, mas não é possível, o silêncio é primordial. Algumas horas se passam, o conhecido é chamado e sai da sala, você continua lá, agoniado, falando consigo mesmo, torcendo para chamarem seu nome ao mesmo tempo em que você deseja que não chamem. O conhecido volta, mas você ainda não pode falar com ele. Mais alguns minutos e te chamam, você sai da sala, vai para uma área ao ar livre e, de lá, para outra sala, fazem perguntas nas quais você aparentemente não se encaixa, você é felizmente (ou infelizmente, no caso) saudável. Uma brecha aparece e você se aproveita. Te mudam de lugar. Alguns minutos ali, aparece um homem, pega os crachás de todo mundo que foi com você, você e seus “companheiros” voltam para a sala anterior. Agora você pode conversar com o conhecido, mas a conversa não dura muito, logo aparece um home que fala algumas coisas, da algumas ordens, todos repetem algumas palavras, fazem algumas promessas que não cumprirão, cantam um hino, recebem seus papeis de volta e são liberados, finalmente, com a ideia de liberdade mais reforçada do que nunca, livres para poderem fazer muitas coisas que não eram possíveis ou, pelo menos eram dificultadas, livres para poderem, sei lá, viver em paz, respirando calmamente, sem medo do que poderia acontecer com relação àquilo que foram libertados.

Ninguém Nunca Descobriu

          Dois garotos, rapazes, homens... Enfim, dois seres humanos do sexo masculino, se encontram todos os dias, não são lá grandes amigos, mas são colegas, de escola, de trabalho... De um exercício que exercitam todos os dias, sempre no mesmo lugar, na mesma hora. Os dois namoram, cada um com uma garota, mulher, ser de sexo oposto ao deles.
          Eles se conversam bem, os quatro se conhecem, os quatro se dão bem. Um dia, em uma espécie de festa, comemoração, encontro na casa de um deles para jogar vídeo game, ou assistir um filme, as garotas acabam não indo e eles decidem não abortar o plano. Os dois conversam, bebem, assistem o filme, jogam vídeo game, conversam, bebem... Os dois estão cansados, alcoolizados, não aguentam mais vídeo game, música, televisão, computador, desligam tudo, se deitam no chão, um em posição inversa a do outro, olhando pro teto, ombros lado a lado, continuam a conversar. Decidem não beber mais. A conversa continua. Um deles vai se levantar, consegue, dá alguns passos e acaba caindo, largando o corpo. Ele cai em cima do outro, com as costas no peito do outro. Os dois riem, o que está em cima se vira a fim de se levantar novamente. Os dois se olham, eles não estão com os rostos paralelos, o olhar é de canto por parte do que está por cima e para baixo por parte do que está por baixo. O olhar se estende por algum tempo, o de cima se move um pouco, o de baixo também, um na direção do outro, até que se encontram. Um se aproxima do outro, os narizes vão se tocando, os olhos se fechando, os lábios se aproximando...
          No dia seguinte, os dois se encontrem com suas namoradas, vão ao cinema, ao restaurante, shopping ou parque, seguem suas vidas, normalmente, como se a noite anterior nunca tivesse acontecido, seguiam suas vidas de forma que ninguém descobriria o que se passara na noite anterior, na sala da casa de um deles... E ninguém nunca descobriu.